Relato da caminhada ao Castelitos.
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O imponente e rochoso Castelitos.
Fotografia : Alexandre Milhorance. |
Há tempos, um cume imponente e pontiagudo chamou a minha atenção. Com os seus 2.240 m de altitude e localizado na Serra dos Órgãos, ele se destaca por estar ao lado das mais altas montanhas da região tendo um formato pontiagudo e inconfundível. Essa montanha me lembrava muito dos imponentes picos nevados das altas montanhas. Mas aqui, ele recebeu o verde da nossa bela mata atlântica. Curiosamente, essa mesma montanha chamou a atenção do Alexandre. E o resultado foi planejar uma caminhada até lá!
Castelitos, uma realização.
Depois de ficar sem caminhar por três longas semanas,Alexandre e eu já tínhamos o nosso roteiro do fim de semana. Estar afastado das montanhas era horrível e para piorar, o tempo não colaborava. Mas no domingo, 13 de Agosto de 2017, fomos abençoados pela natureza de uma forma surpreendente. Depois de pegar o ônibus e chegar ao terminal, esperei o meu amigo chegar. Quando ele chegou, o nosso ônibus estava prestes a sair. Não perdemos tempo e embarcamos. Já dentro do ônibus, procuramos os nossos assentos e nos sentamos. Pelo caminho, conversamos muito e demos boas risadas. Descemos quase no ponto final do Pinheiral, no Bonfim. Pegamos a estradinha de terra e andamos por cerca de 1km até chegar a portaria do PARNASO(Parque Nacional da Sera dos Órgãos) em Petrópolis. Pagamos os nossos ingressos e iniciamos a longa caminhada do dia. Notei que o tempo estava nublado e fazia bastante calor logo pela manhã. Certo tempo depois, paramos num riacho para tomar aguá e encher os nossos recipientes. Voltamos a trilha e subíamos num bom ritmo. Bastante animados e bem motivados, chegamos a cachoeira do Véu da Noiva e fizemos um tempinho por lá.
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Cachoeira do Véu da Noiva. |
Ficamos lá admirando aquele belo lugar e aproveitamos para lanchar e nos hidratar. Satisfeitos, bem alimentados e descansados, novamente voltamos para a trilha. Subíamos bem rápido, até o corpo cobrar por um momento de descanso. Paramos numa laje e enquanto recuperávamos o fôlego, notamos o lindo visual daquele lugar. Apesar do calor, o tempo estava estável e com o céu limpo. Observei o Morro do Açu e o Morro do Alicate.
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Morro do Açu e Morro do Alicate vistos da parte de cima da cachoeira. |
A nossa esquerda, aparecia também o pontiagudo Pico do Glória, uma bela montanha. O dia era promissor e nós não perdemos tempo. Continuamos a nossa jornada em direção ao Morro do Cubaio. Chegamos a Janela do Bonfim, mas a névoa baixa não nos permitiu desfrutar desse mágico lugar. Entramos numa linda mata, com muitas árvores, bromélias e orquídeas em grande quantidade. Sem falar no agradável cheirinho de mato.
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Trecho de laje e bromélias. |
Seguimos no arranque e vencemos uma longa e íngreme subida num calor sufocante. Até chegar na crista foi um tremendo castigo. Já na crista nos deparamos com uma visão espetacular com o sol acima de nós, e ás nuvens, aos nossos pés.
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Surpreendente visual ao alcançar a crista. Ao fundo o Taquaril. |
Não poderíamos desejar um dia melhor para esse roteiro. O nosso primeiro cume estava próximo, mas faltava um pouquinho mais. Faltava pouco para alcançar, e o calor aumentava o desgaste. Antes de partir para a reta final e alcançar o cume do Morro do Cubaio,
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Morro do Cubaio, Castelitos, Morro da Luva e Contra-Forte da Luva (Luvinha)
Esq-Dir. |
Alexandre e eu decidimos fazer uma parada para recuperar as energias num mirante bem chamativo. Lanchamos de novo, tomamos água, isotônico, e fizemos algumas fotos e vídeos do local. Quase não ventava e então as mutucas começaram a aparecer.
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Alexandre Milhorance fazendo seus registros no mirante. |
Nos organizamos e voltamos a andar para escapar das doloridas picadas desses insetos perturbantes. Momentos depois, finalmente alcançamos o cume. Dessa vez, com o tempo impecável. Diferente de três semanas atrás, com o tempo nublado, frio e com um vento forte e gélido. Fizemos mais registros e descansamos.
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Fantástico visual do Morro do Cubaio. |
Um novo destino.
Sabíamos que a jornada não tinha acabado. Agora que começaria pra valer. Depois de conversas, avaliações e muita vontade, partimos então rumo ao Castelitos.
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Castelitos a partir da descida do lajão. |
Fomos sem facão - pois o uso do mesmo só é permitido com pedido antecipado. Decididos, abastecidos e com muita determinação, começamos a fazer a nossa rota na ''marra''. O começo já foi um teste e tanto, pois tínhamos que passar por um trecho de bambus entrelaçados. Para a nossa sorte, era um trecho curto e que deu um certo trabalho. Após passar pelos bambus, chegamos num trecho de mata rasteira e seguimos vestígios do que parecia ser uma calha antiga e que de tempo em tempo, ficava bem confusa. Optamos pelo bom senso. Chegamos num lajão e começamos a ladear, seguindo alguns totens, até aparecer um vale ao fundo. Paramos e observamos tudo, avaliando cada parte daquele lugar encantador. Víamos totens, outras lajes de pedra e muito capim-de-anta. Olhamos também para o Castelitos e começamos a caminhar. Depois de descer as lajes, entramos num trecho com muito capim-de-anta e íamos lutando para dar um passo a frente. Vencido esse trecho, entramos novamente na mata, só que dessa vez, tivemos que fazer o dobro do esforço para sair dos fortes galhos que estavam em nosso caminho.
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Predominância do capim-de-anta no vale. Pipoca e Pedra do Sino.
Esq-Dir. |
Desviamos até ficar cansados, perfurados e arranhados pelos pontiagudos e dolorosos espinhos desse trecho. Essa foi a pior parte da trilha, pois o calor era sufocante, o ritmo era mais lento e causou um pouco de estresse. Quando saímos desse matagal, paramos numa laje cheia de totens e Alexandre rapidamente viu uma forma de subir. Mas antes, mais um trecho ''nadando'' no capim-de-anta. A laje que nos daria acesso a parte final estava perto e longe ao mesmo tempo. Parecia estar a quilômetros de distância por conta das condições em que nos encontrávamos. Foi uma guerra vencer o capim com as pernas cansadas de subidas e descidas, calor sufocante, cortes e arranhões em todas as partes do corpo.
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Mar de capim-de-anta. |
Quase lá.
Foi aliviante chegar a laje para poder descansar e tentar relaxar um pouco. Não estava sendo nada fácil, mas faltava pouco, muito pouco para ter uma experiência fantástica nesse estranho domingo caloroso. Quando iniciamos a subida das lajes, tive câimbras terríveis. Vencemos algumas subidas de lajes e voltamos a entrar no capim-de-anta, que não parecia ter fim. Vinte minutos depois, começamos a perceber que a inclinação estava diminuindo. E isso significava que o cume estava próximo. Não demorou e então vimos os incríveis blocos do cume do Castelitos, bem a nossa frente. Foi emocionante e comemoramos muito. A maravilhosa visão deste cume nos permitiu olhar as belas montanhas da Serra dos Órgãos por ângulos que jamais poderíamos imaginar.
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Linda visão a partir do cume do Castelitos. |
No cume vizinho, Morro da Luva, havia um grande grupo que seguia na travessia Petrópolis x Teresópolis. Atrás de nós, descortinava-se, ao longe, o impressionante maciço de montanhas da região dos Três Picos, em Friburgo. Vimos o Pico Maior, Médio e Menor,Capacete, Seio da Mulher de Pedra e tantas outras montanhas. Bem perto, o Morro do Pipoca, Papudo, Pedra do Sino, Garrafão, Dedo de Nossa Senhora, Escalavrado, e até a pontinha do Dedo de Deus. O lanche no Castelitos teve um sabor pra lá de especial. Atingimos com sucesso o terceiro ponto mais alto da nossa serra, numa montanha pouco frequentada e bastante preservada.
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Visual do cume para as montanhas de Petrópolis.
Fotografia : Alexandre Milhorance. |
A Serra do Cantagalo era fascinante vista dali. O vale do Bonfim, agora, estava ao nossos pés e apresentava uma enorme garganta, repleta de muitas rochas e o predominante verde da mata.
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Ao lado dos incríveis blocos do Castelitos.
Fotografia : Alexandre Milhorance. |
Recuperados, com registros inéditos, começamos a longa jornada de volta. Foi mais desgastante voltar do que chegar até ali.
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Nosso registro antes de partir. Surrados e orgulhosos. Felicidade sem tamanho! |
Enfrentamos todos os desafios da ida com muita força de vontade, mas num ritmo bem diferente. Minha água tinha acabado, estava com câimbra nas subidas e totalmente cansado. Chegamos ao Cubaio depois de muito esforço e fizemos uma parada rápida. A minha salvação foi o Camelbak do Alexandre. Mas durante a descida, a água dele secou. Descemos rapidamente, sem parar e chegamos na cachoeira do Véu da Noiva. Abastecemos os recipientes, nos deliciamos com a água gelada e tocamos rumo a portaria. Na descida, faltando pouco para chegar a portaria, topei com um homem e uma mulher, um pouco a frente. Eu tinha a ligeira impressão de que os conhecia, mas ao mesmo tempo, não tinha certeza. Eles acabaram reparando que íamos depressa e abriram o caminho para que pudéssemos passar. Agradecido,desejei uma boa tarde ao casal. O homem, por sua vez, perguntou se o meu nome era ''Mateus''. Provavelmente me reconheceu pelo chapéu. Confirmei o meu nome e tinha o dele na ponta da língua : Era o Marcel Leoni, montanhista e escalador petropolitano. Amigo das redes sociais e que eu sempre acompanhava as suas atividades nas montanhas. A moça que estava com ele era a sua namorada, Denise Oliveira. De forma rápida, nos cumprimentamos e seguimos descendo rapidamente a trilha. Chegamos na portaria e pegamos a estradinha de terra. Ao final dela, reencontramos o asfalto e esperamos o nosso ônibus aparecer. Enquanto isso, papeamos muito sobre a recente aventura que fizemos com muito orgulho. Finalmente o ônibus apareceu e então embarcamos. Chegamos ao terminal e me despedi do Alexandre, pois o ônibus dele já estava prestes a sair. Fui para o meu ponto e sentei ali mesmo, encostado numa das estruturas, estava exaurido. Como faltavam 01h30 para a chegada do meu transporte, fiquei revendo as fotos e olhando os vídeos, ainda incrédulo, pois foram ao todo 10h de trilha somando a ida e volta. Algumas pessoas me olhavam de forma estranha e outras, curiosas. Eu estava com a calça suja, bastante arranhado, perfurado, com manchas de sangue na calça, mochila nas costas e com um sorriso no rosto. Ao ouvir o conhecido barulho do motor, conectei o fone de ouvido no celular e fui me sentar para relaxar com algumas músicas. Foi uma experiência fantástica numa montanha preservada e com um amigo que compartilhava dos mesmos sentimentos.