sábado, 2 de março de 2019

Pico do Alcobaça ou Pedra do Sete

O Alcobaça é uma linda montanha de Petrópolis situada no Bonfim. Ela se destaca facilmente por sua imponência e seu formato cônico. Com os seus 1.811 metros de altitude e com desnível de 500 m bem íngremes, é também símbolo do CEP- Centro Excursionista Petropolitano.  A trilha começa num vale belíssimo  e termina com trechos íngremes e escorregadios. Seu acesso é pelo Vale do Bonfim. A montanha é a mais alta do conjunto que leva o seu nome, o '' Conjunto do Alcobaça'', que faz parte do PARNASO( Parque Nacional da Serra dos Órgãos). Do seu cume é possível avistar praticamente toda a cidade de Petrópolis e algumas partes do Rio de Janeiro. Além de ser um cume relativamente espaçoso, tem campo de visão com 360͒. Sem duvida a melhor vertente para curtir o lugar e fazer um lanche é voltada para Leste, onde esta o maciço da Serra dos Órgãos com as montanhas acima dos 2.000 metros de altitude.
Cume cônico e imponente do Alcobaça.
 Improviso!

Era terça-feira, 05 de Setembro de 2017. Conversava com o Lucas Lourenço Rocha sobre uma trilha que tínhamos marcado para fazer. Combinamos tudo e disse a ele que levaria meu amigo Davi também. A trilha que faríamos seria  o Morro da Mensagem até a  Pedra de Itaipava, na Serra das Araras. A ideia da travessia era muito boa e a distância entre esses dois cumes totalizava 4 km. O trajeto não era dos mais atraentes: Crista penosa, exposta, repleta de capim-navalha e espinhos na altura da canela.  Avisei ao Davi sobre a trilha e ele topou. Contei a ele sobre o visual do lugar, do tão temido trecho exposto do Morro da Mensagem e também da placa que existe nesse trecho em homenagem ao montanhista que faleceu ali( Oliver Ochs) em 01 Outubro de 2002. Soube pelo livro do Waldyr Neto e pelo ''Zecão'' que o Oliver era figura fácil do CEP e conhecido por muitas pessoas. A sua queda infelizmente foi fatal, com o seu corpo parando  cerca de uns 200 metros abaixo. 
Placa no trecho exposto do Morro da Mensagem.
 Apesar da trilha ser bem leve, o trecho em si é sombrio e muito perigoso. É recomendável o uso de cordas para se fazer a proteção. Mas vale lembrar que não basta somente ter uma corda, tem que saber usar e fazer todos os procedimentos com segurança. Caso não tenha experiência com as cordas e tudo mais, vá com montanhistas experientes! Expliquei muitas coisas ao meu amigo que parecia bem animado. No mesmo dia compramos uns pacotes de pão de forma, maionese e latas de sardinha. Preparamos patê com pão e guardamos num pote dentro da geladeira de casa para conservar. Também compramos bolo e consideramos as garrafas de água. Já no dia da trilha, levantei um pouco sonolento. Tomei café e segui para encontrar meu amigo na rua.  Assim que o ônibus chegou, embarcamos e procuramos os nossos lugares. Coloquei meu fone de ouvido e fui curtindo minhas  músicas favoritas. Não pude deixar de notar o comportamento estranho de uma jovem sentada do outro lado, próximo a janela. Comentei com o Davi sobre o que observava e voltei a minha atenção para a janela e a paisagem. O ônibus seguia descendo o Vale do Carangola e o meu olhar foi diretamente para a Maria Comprida. Automaticamente surgiu no meu rosto aquele sorrisinho tímido. Eu havia feito a trilha no final de semana anterior e custava a acreditar. Aproveitei o amplo campo de visão para apreciar o conjunto do Taquaril e suas belas montanhas. Daí em diante segui curtindo algumas músicas do ''The Verve''. É nada poderia ser melhor do que escutar a música ''BitterSweet Symphony'' olhando as montanhas naquela manhã.  Então o ônibus finalmente chegou ao terminal e desembarcamos.  Em seguida, acompanhei Davi até a lanchonete. Ele estava com vontade de comer biscoito salgado. Comprou dois pacotes de torcida sabor de pimenta mexicana, mesmo comigo dizendo que poderíamos dividir um tranquilamente. Acabamos por comer os biscoitos enquanto aguardávamos notícias do Lucas. Já um pouco ansioso, olhava a hora de tempos em tempos e não pude deixar de dar boas risadas com as queixas do meu amigo a respeito do preço do biscoito. As 06h32 chegou a mensagem do Lucas. Na mensagem ele dizia que ainda estava passando mal. E reforçou também que os amigos dele iriam a trilha. Por não conhecer os amigos de Lucas, fiquei meio sem jeito de ir com eles. Voltei a atenção para o Davi e disse a ele o que ele certamente gostaria de ouvir. Disse a ele da seguinte maneira: '' Davi, Lucas não vem. Mudança de plano. Vamos para o Alcobaça''. Não fiquei surpreso com a animação dele. Aliás, tinha perdido as contas de quantas vezes ele falara da vontade de ir ate lá. Ele gostava muito da montanha e eu prometi que o levaria até ela.  Bom, a hora chegou!

Rumo ao Alcobaça.

Após informar a ele o nosso novo destino, olhei para a plataforma 2 e lá estava o Bonfim. Entramos e esperamos a partida. Não demorou e então os motores começaram a dar o ar da graça. Fomos conversando muito durante o percurso . Enquanto subíamos o lindo Vale do Bonfim, olhava para o meu amigo de vez em quando. Sem surpresas, a cara era de felicidade e eu conhecia aquele sentimento, de estar a caminho de um lugar que gostaria tanto de conhecer. Davi na quarta-feira nada mais era do que o Mateus de domingo. Logo desembarcamos do ônibus e seguimos subindo para o Pinheiral a pé. Subimos a rua aproveitando a bela visão da Pedra do Cone.
Pedra do Cone.
 Andamos até trocar o asfalto por terra e chegamos a estradinha de acesso para a portaria do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Após andar um pouco surge á direita a Capela do Bonfim.
Capela do Bonfim.
 Passamos ao lado do famoso ''Tourinho'' e seguimos até a entrada do sítio Ughetto - onde tenho ótimas recordações. Passava o verão lá com os meus primos. Saudades daquele tempo....

Ao chegar lá, Davi olhou a placa indicativa e continuamos no nosso caminho. Era bem cedo daquela manhã e já tinha gente trabalhando a todo vapor nas plantações. Cumprimentamos todos que atravessavam o nosso caminho com muita educação e carisma. Passamos ao lado de uma casa cujo jardim estava repleto de belas flores. O dono tinha bom gosto. Quando voltamos a caminhar, apareceu uma figura que acrescentaria o nosso dia.

Uma boa companhia ou uma ótima companhia?

Ao ouvir o barulho de nossos passos, uma cadela abandonou a sua casa e decidiu nos seguir. Recepcionei ela com muito carinho e então seguimos em direção a montanha. Achei engraçado quando meu amigo me perguntou, de forma duvidosa, se ela- a cadela-, nos seguiria até o topo. Respondi a sua pergunta de forma bem clara : ''Davi, creio eu que alguns montanhistas renascem em formas caninas''. Citei até o trio de cachorros de Araras.  O dia estava bem agradável e com calor considerável. Paramos para descansar em frente ao casebre de alvenaria abandonado que marca o início da trilha do Mãe D'água, montanha vizinha do Alcobaça, nosso destino.
Casebre que marca o início da trilha do Mãe D'água.
 Tirei o meu casaco e o guardei na mochila. Aproveitei a parada pra tomar água. Estava bem confortável com o short. Geralmente prefiro usar calça, mas com o calorão que fazia na serra, era praticamente impossível. Hidratados e alimentados, levantamos do chão e decidimos prosseguir. A cadelinha não perdeu tempo e começou a nos olhar. Fiz um registro dela e voltamos a caminhada, passando ao lado de alguns fios d'água e plantações.
Companheira fiel.
 Sobe,sobe,sobe!

Após caminhar por um tempinho, chegamos ao ponto onde inicia-se a subida propriamente dita da montanha.  Dei uma olhada na placa indicativa da travessia Uricanal e fiquei surpreso ao ver que não tinham vandalizado. Antes de lanchar e iniciar a subida, investiguei a trilha do Morro da Bandeira. A calha estava bem visível e então voltei até onde o Davi estava. Sentei o lado dele e peguei suco e pão na mochila. Recuperados e bem energizados, iniciamos a subida indo com calma.  O desnível até o cume seria de 500 metros verticais numa subida íngreme e exigente. Aproveitamos o trecho inicial da caminhada ao som do vento na copa das árvores e da melodia dos pássaros. As flores e a mata nos refrescavam com a sombra e embelezava o caminho com algumas bromélias. 
Trecho de mata com bromélias.
 Caminhamos pela mata superando alguns trechos erodidos, subidas fortes e degraus até abandonar a mata, chegando num campo mais aberto e já exposto ao sol. Subimos até um local mais amplo e com bom lugar para descansar. Enquanto recuperava o fôlego, recomendei a Davi para que olhasse o visual.  Ele o fez e então reparou as montanhas da Serra da Estrela, onde esteve comigo por duas vezes, realizando a travessia Cobiçado-Ventania.  Mostrei a ele o maciço da Serra dos Órgãos bem pertinho de nós.
Montanhas da Serra da Estrela.
 Rala-bunda.

Depois de ter feito os registros, voltamos a colocar os pés para funcionar e chegamos ao trepa-pedras que antecede a subida final do Alcobaça. Vencemos o trecho e mostrei a ele a bifurcação que leva ao Morro do Teto, outra montanha vizinha com acesso por um crista linda e longa. Com o Davi e a cadelinha na minha cola, iniciei a subida escorregadia do cone do Alcobaça. Subíamos com cuidado evitando escorregar. Vencemos o trecho e alcançamos o topo. Davi me agradeceu e nos cumprimentamos com um abraço. Custou pra ele acreditar que estava lá e eu entendia perfeitamente bem aquele sentimento. Foi fantástico ver a emoção dele e eu sabia o quanto aquela montanha significava para ele. Aproveitei e fiz alguns registros dele. Por conta do calor e da baixa resolução da câmera do celular, não consegui bons resultados. Mas o mais importante era guardar recordações do dia.
Davi aproveitando o  visual do cume.
 A cereja do bolo.

Mostrei ao meu amigo todas as vertentes possíveis da montanha. O visual do lugar estava encantador com o predominante azul do céu e sem nuvens, possibilitando olhar os horizontes que se descortinavam diante dos olhos. Antes de escolher um local para descansar, lanchar e conversar, peguei sacola plástica na mochila e uma luva para recolher um pouco de lixo que deixaram lá. Enquanto eu limpava, Davi me registrou no ato!
Limpando a sujeira!
 Retirei todo o lixo que vi por lá e coloquei na sacola. O mínimo do mínimo  é recolher todo o nosso lixo. Tudo que levamos para a natureza, temos que trazer de volta. Leve sempre sua sacolinha para armazenar o seu lixo e retirar também o que foi deixado pelos outros. Lixo acaba atraindo mais lixo. Quanto mais limpo o ambiente ficar, menos pessoas terão vontade de deixar lixo no lugar. Com o dever de casa feito, sentei ao lado de Davi num pedrão que mais parecia um banco. Lugar ideal para curtir a montanha. Mostrava ao Davi as montanhas e os seus nomes. Olhava com lágrimas nos olhos para a Maria Comprida e o Castelitos, duas impressionantes montanhas da cidade. Contava a meu amigo sobre o mar de capim-de-anta que atravessei e sobre como foi emocionante chegar ao Castelitos. Considerava aquela montanha uma lenda, uma montanha preciosa e que o destino correspondia a altura da árdua caminhada.  Demos uma pausa na conversa e retiramos da mochila o suco, os pães e o bolo. Oferecemos tudo o que tínhamos ali para a cadelinha e ela não quis. A danadinha somente cheirou, investigando o que era. O bichinho só queria dar uma volta com a gente mesmo. Com boas conversas e risadas, levantamos e fizemos alguns registros do cume antes de descer.

Hora de partir.

Já satisfeitos com a caminhada, pegamos as nossas tralhas e voltamos a trilha.  Descemos com calma e cuidado. Mas foi difícil manter a total atenção na volta. A cadelinha desceu praticamente rolando e se esfregando na mata o tempo todo. Eu não conseguia parar de rir e até gravei ela no ato. Não demorou muito e chegamos ao final da descida. Chegamos ao ponto de ônibus bem animados. Davi estava alegre e extasiado e eu fiquei feliz com isso. 
Esperando o busão!
 Embarcamos no ônibus e chegamos ao terminal rodoviário.  De lá, seguimos pra casa no 615(Vale do Carangola) . Despedi-me de Davi na rua e mais uma vez ele me agradeceu. Cumprimentei ele e fui pra casa com outra bela caminhada na companhia de um amigo e uma cachorra pra lá de companheira que enriqueceu o nosso dia. Fazer o que ama e ainda conseguir ajudar os outros não tem preço!