sábado, 2 de maio de 2020

Cabeça de Negro/Serra da Estrela

O Cabeça de Negro está situado na Serra da Estrela e eleva-se a 1.113 metros de altitude acima do nível do mar. A montanha também é conhecida pelos nomes de Cabeça de Frade e Pedra da Tocaia Grande. Essa montanha foi retratada em muitas obras. Umas delas é do pintor alemão Rugendas durante a expedição do barão Von Langsdorff ao Brasil em meados de 1821. No período colonial o ‘’Caminho Real’’ que passava próximo a base da montanha era um atalho importante utilizado pela Coroa para chegar em Minas Gerais a partir do Rio de Janeiro. Situada na Serra Velha e fazendo parte das montanhas da Serra da Estrela e pertencendo a Serra dos Órgãos, esta montanha chama a atenção de quem sobe ou desce a antiga estrada que ligava Petrópolis ao Rio de Janeiro passando pelo distrito de Magé. As paredes desta montanha alternam cores amareladas e alaranjadas de granito bem sólido.O nível de caminhada desta trilha é considerado leve-superior tendo a sua duração de caminhada entre 01h30 à 02h00. A trilha tem início no Lopes trovão em Petrópolis, passando pelo antigo caminho do trem na Serra Velha. A maior parte da trilha é feita em meio a Mata Atlântica com a linha da trilha repleta de raízes, leitos de riacho seco e pequenos riachos, degraus de pedras e vegetação seca no solo. É recomendável ir com um montanhista responsável e que conheça o local pois surgem algumas bifurcações durante a trilha. Além dos caçadores que frequentam a região, existe uma trilha que contorna a montanha para dar acesso a Agulha Inhomirim e para a Agulha das Estrelas( Pedra da Foca). Para os que curtem uma boa caminhada dentro da mata essa trilha é ideal por sua rica biodiversidade. Com sorte podemos observar tatus, macacos, muitas espécies de aves e bromélias. De seu cume é possível ver o Castelinho, Pedra do Lagoinha e algumas montanhas da Travessia Cobiçado-Ventania de um ângulo impressionante. Além dessas, vale mencionar a Pedra Redonda, Cortiço, Morro dos Macacos e Dois Irmãos de Pau Grande. Também é possível ver a Bahia de Guanabara e toda a Baixada Fluminense. A melhor estação para se fazer escaladas ou caminhadas em montanhas é no inverno. No verão também é possível realizar esta trilha. Mas esteja preparado para as tempestades fortes e repentinas do verão e das temperaturas que podem atingir os 40°C.
Cabeça de Negro a partir da Pedra do Cortiço.

Reencontro.
Depois de ficar por um longo período afastado das trilhas devido a problemas pessoais, resolvi que já tinha passado da hora de voltar a caminhar. Fui fazendo algumas trilhas nesse início de ano para pegar ritmo e aproveitar para conhecer novos lugares. Ano passado estive no Seio de Vênus com o Huriel e o Renan Machado. Levou um bom tempo para marcar uma trilha com o Renan.  Ele sempre me convidava para fazer umas trilhas e eu até queria, mas realmente não podia. E quando eu o convidada, não dava pra ele ir. Mas desta vez não teve jeito e o resultado foi aproveitar o feriado para realizar essa bela trilha. Combinamos tudo na quinta-feira e a previsão do tempo estava favorável. Pela noite eu organizei a mochila, ajustei o despertador e fui dormir. Então marcou 07h25 da manhã e eu despertei. Fui até a cozinha para fazer o café e colocar o lanche na mochila. Me ajustei e fui para o ponto de ônibus aguardar  até o horário de sua saída. Cheguei rapidamente ao centro da cidade e segui para a praça ‘’Duque de Caxias’’ que é popularmente conhecida como praça do ‘’Skate’’ e encontrei o Renan. Nos cumprimentamos e fomos para o ponto esperar o próximo ônibus. Enquanto aguardava o transporte chegar, conversava com o Renan sobre às trilhas e da situação atual em que nos encontramos por conta do COVID-19. Apesar das recomendações para o uso de máscaras e álcool gel, vi muitas pessoas conversando e se aglomerando em alguns pontos. Após uma espera de mais ou menos 15 minutos,  vimos o 453 – Meio da Serra- chegar e já embarcamos. O dia estava bem fresco pela manhã e com o lindo céu azul.  Rapidamente chegamos ao local e desembarcamos num ponto de ônibus  que fica de frente para um bar do lado esquerdo no sentido de quem desce a serra. No mesmo lado, outro ponto de ônibus e uns metros a frente a placa com os dizeres: ‘’Linha Férrea, Pontilhão’’. 
 Seguimos até a entrada da rua após essa placa, descendo à esquerda. Aproveitei para fazer um registro do local com a mistura da mata, das casas e da Pedra do Cortiço. O local onde a foto foi feita é histórico.
Pedra do Cortiço à direita.
  Foi exatamente na ponte em que existia a linha férrea onde o trem passava. A estação em Petrópolis foi inaugurada em 1883 e reformada sendo utilizada como estação rodoviária. Em 5 de Novembro de 1964 ela foi desativada.
Enquanto caminhava por aquele belo trecho e conversava com o Renan, notei que aquela estrutura era bem alta e um riacho passava por debaixo dela, com a água escorrendo pelas pedras. Seguimos descendo até sair desse trecho e pegar uma rua em péssimo estado. Surge uma casa dividindo duas bifurcações. Continuamos pela esquerda passando ao lado de uma casa com um muro em construção e uma rua que alternava terra e entulho até ficar somente com a terra, mato e os postes. Ao lado esquerdo apareciam algumas entradas de trilha de tempo em tempo. Meu companheiro de trilha me contava da sua primeira vez naquele lugar. Imaginei a canseira que deu ficar entrando e saindo de trilha até chegar na correta. Um longo tempo descendo e então surge uma entradinha discreta à esquerda, bem ao lado de um poste.
Entrada da trilha.

                                                          Hora de caminhar.
Iniciamos a subida da trilha até virar para a direita. A sombra da mata e a vegetação espaçada me chamou bastante atenção. A calha da trilha era bem visível e tive a sensação de que aquele lugar certamente era bem preservado. O trecho inicial se apresentou de forma leve e surpreendente com o ar refrescante e a sombra por conta das grandes árvores que bloqueavam a luz do sol em grande parte. Devagar e com calma continuamos a subir e logo fizemos um desvio. Um grande tronco bloqueava a trilha e realmente não tinha como passar. Pegamos uma trilha do lado esquerdo e contornamos o bloqueio. Seguimos com a calha sempre bem visível a nossa frente. A trilha entra ainda mais na exuberante mata até surgir uma bifurcação. Ambas se encontram logo acima e dão continuidade a trilha. Eu estava adorando tudo e não só por estar em boa companhia ou conhecendo um lugar em que nunca estive antes. 

Renan Machado na trilha.
Estava testando a bota que comprei na prática para ver se ela iria me decepcionar ou não. O resultado foi incrível. Eu comprei uma bota da Snake, modelo BloxIII Dry na cor verde. O investimento valeu a pena. Apesar de ser robusta, o calçado era leve, confortável e impermeável.
Ótima bota. Produto nacional de qualidade!!!

Caminho agradável

Ainda na subida bem leve da trilha passamos por outro tronco caído e passamos por debaixo facilmente. O clima estava ótimo para se caminhar e íamos aproveitando a umidade da mata, o canto dos pássaros, o barulho d’água...
O caminho seguia bem leve e chegamos num trecho com degraus de pedras com bastante musgo e um pouco molhados. Caminhamos com atenção até passar por pequenas rochas mais lisas.

Degraus de pedra.
Foi nesta parte da trilha que escutei o Renan me alertar de uma bela aranha que atravessou o nosso caminho.  Ela saiu da mata e de forma inexplicável, parou justamente no nosso caminho. Era uma caranguejeira das grandes, bem peluda e com longas patas e um abdômen bem definido. 
Aranha-Caranguejeira.

Ela era preta com pelos brancos nas pernas e com pelos  num tom de marrom amadeirado. Acho que este espécime macho queria deixar o recado de que a casa era dele e nós éramos os invasores. Admiramos o belo animal antes de prosseguir. Respeitamos o seu espaço e evitamos qualquer tipo de contato. Infelizmente existem pessoas que matam estes animais em seu ambiente seja por ignorância, medo ou por pura maldade. Às aranhas-caranguejeiras não são tão perigosas quanto outras espécies de aranha. Seu veneno não é mortal para nós. A picada é dolorosa e causa alguns sintomas incômodos. Elas tem hábitos noturnos e sedentários. Os machos são vistos apenas no período de reprodução e procuram por fêmeas. Eles geralmente são encontrados no solo onde fazem seus ninhos  em buracos e nos troncos de árvores caídas. Existem também espécies que vivem em árvores e nas bromélias. NÃO MATEM OS ANIMAIS, NÃO OS ALIMENTE E NÃO SE ARRISQUEM DESNECESSARIAMENTE!!!
Com o fôlego recuperado e bem animados com a surpresa inesperada avançamos por um tempo até a trilha seguir para o lado direito eaté começar a descer. Logo mais a trilha chega numa outra descida com a subida do outro lado, numa espécie de transição. Entre esta descida e a subida tem um leito de riacho seco e o inconfundível barulho da água correndo mata adentro, cortando caminho pelas pedras e seguindo seu curso natural.  Chegamos ao riacho após subir ladeando a trilha bem estreita até virar a direita. Ali certamente era um ótimo local para descansar. Renan abasteceu sua garrafinha de água e papeamos um pouco antes de voltarmos ao caminho.
Riacho que separa a trilha.

No retorno da caminhada Renan quis me mostrar a parte de cima do pequeno riacho onde tem uma pequena queda e um poço.
Borracha para captação de água.

                      Novamente voltamos a trilha com o sol tocando o verde da mata atlântica com mais intensidade. O caminho continuava a subir bem leve até chegar num trecho relativamente plano e passar por uma valeta . A trilha volta a subir e passamos num trecho com bambus ao lado da trilha e ao fim dessa subida, surge mais uma bifurcação. À esquerda segue para a trilha que dá acesso a Agulha Inhomirim e também a Pedra da Foca ou Agulha das Estrelas. À direita leva em direção ao topo do Cabeça de Negro. Continuamos seguindo a trilha passando por outro trecho com bambus e com folhas secas no solo.  Novamente surge uma entrada a direita e a trilha segue em frente.                                      
Bela bromélia.
                                                        Quase na hora do lanche...

Subindo mais um pouco surge outra bifurcação. Ao lado de uma imensa árvore e seguindo a esquerda é a trilha que leva ao cume. À direita fica a trilha que é conhecida como ‘’Caminho dos  Cristais’’. Renan me explicou e fomos pra lá. Não levo nem 5 minutos. Descemos um pequeno colo, mais uma subida bem leve e lá estávamos nós, num trecho de solo um pouco erodido com um monte de quartzo de todas as formas e tamanhos. Aproveitei o momento para dar uma explorada naquele lindo lugar. 
Quartzo.

Apesar de ser bem amplo e vegetativo, dava pra ter uma visão magnífica da serra velha e da Pedra do Cortiço logo a frente. Ao olhar para trás, vi o Castelinho,  Torres do Morín, Pico dos Vândalos, Pedra do Diabo e a Pedra do Inferno de um ângulo totalmente encantador. 

Visual  para as montanhas da parte alta da Serra da Estrela.

Fui com o Renan até um mirante para observar os paredões da montanha e aproveitei para curtir as montanhas da cidade que apareciam no horizonte.
Algumas das nossas montanhas.
Paredão da montanha.
Depois retornamos para a parte mais alta do ombro e dei uma boa olhada nas montanhas que via dali: Rolador, Morro dos Macacos, Ovo de Colombo entre outras.  O dia estava maravilhoso e o céu permanecia com o azul dominando grande parte.
Montanhas da Serra da Estrela.
Aproveitei a carona e também pedi para o Renan fazer um registro meu naquele lugar para guardar a recordação. Fiquei agachado para não interferir tanto na paisagem.
Tapera, Pedra do Lagoinha e montanhas da Cobiçado-Ventania.

Levei café, biscoito doce de morango e pães recheados. Tive a infelicidade de esquecer a caçarola que comprei em casa. Então aproveitei para me deliciar com o lanche e aproveitar a maravilhosa visão daquele lugar. 
Hora do lanche!!!

Renan e eu ficamos papeando por um tempo e depois de ajeitar a mochila e sacudir a poeira, voltamos para pegar a trilha até o cume, que agora estava bem mais próximo.

                                                              Rumo ao topo.

Um ponto negativo desta trilha é que mesmo não sendo tão frequentada como outras montanhas da região havia uma quantidade de lixo absurda. Tinha de tudo: sacolas plásticas, pacotinhos de suco, papel alumínio e  etc... Renan recolheu bastante coisa na subida e na descida ainda recolheria muito mais. Chegando perto do cume notei que surgiu uma subida bem íngreme com a trilha estreita. Talvez a subida mais ‘’pesada’’ era essa até onde eu me lembrava. Continuamos tranquilamente, parando somente uma vez e ao fim desse trecho ,surge um descampado. Pegamos uma trilha saindo mais para a esquerda e chegamos ao cume. Notei que era bem vegetativo e com pontos certos para conseguir observar o visual. Tinha lixo no cume também e restos do que parecia ser uma fogueira. Apesar de montanhistas frequentarem o local, também tem caçadores que usam as trilhas  colocando armadilhas para prender pássaros. Uma cultura ignorante e totalmente egoísta e desprezível de alguns seres humanos.  Coloquei a mochila no chão e retirei da mochila a garrafa PET que levei e tomei bastante água. Do cume consegui ver os dois Irmãos de Pau Grande, alguns morros com denominações desconhecidas e vi até a Pedra do Capeta. 
Agulha Itacalomi e Pedra Mãe em destaque.
Dois Irmãos de Pau Grande e parte da Baixada Fluminense.
                                         
  Lanchei no cume para reforçar o corpo e voltei a papear com o Renan. A temperatura começava a aumentar devagar e o vento refrescava ao bater no rosto. Depois do descanso demos uma volta pela área e tentamos registrar a Agulha Inhomirim. Observamos a Baixada Fluminense e a Bahia de Guanabara.  
                                               
Cume da Agulha Inhomirim.
  
Perto de um mirante com uma visão fantástica para a mata do brejo, Renan pisou num formigueiro e se deu mal. As formigas eram pequenas com cor de café e entraram na bota dele, agarrando na meia e na pele. A cena foi bem inusitada. Ele retirando as botas, a meia e até a calça. Por sorte ele tinha um short e eu subi até o cume para buscar. Depois do incidente ficamos por um tempo no mirante aproveitando e fizemos alguns registros. 
Visual do mirante.
Muito verde e belos picos dessa região rica em biodiversidade.



Mata Atlântica.
Ficamos por um bom tempo no mirante aproveitando o belo visual que se descortinava para nós. Só depois de um bom tempo que reparei numa flor que estava atrás do Renan. E era muito bonita. Tive que fazer um registro.
Bela cor para uma flor.
Antes de pegar o caminho de volta para descer a trilha, fiz um registro nosso por lá.

Boinas da montanha. Renan no café.
Por volta de 13h30 decidimos descer. A volta foi bem tranquila. Batemos papo, fizemos alguns registros e catamos o que foi possível de lixo na trilha.  
Renan no fim da trilha com a sacola de lixo.

SEMPRE LEVE O SEU LIXO DE VOLTA . E RETIRE DA TRILHA TODO LIXO QUE FOR POSSÍVEL SEMPRE!!!


Já na rua de acesso próximo a ponte onde o trem passava havia uma aglomeração de pessoas ouvindo música e fazendo churrasco. Ninguém de máscara ou com semblante de preocupação. E essa não foi a única cena inusitada do dia...

Pela manhã eu não percebi a quantidade absurda de lixo e entulho despejados na mata em direção ao riacho. Uma enorme falta de educação e um desrespeito enorme com a natureza. Infelizmente em nosso país estamos longe de ter um bom governo, uma boa estrutura para a educação, saúde,infra-estrutura e saneamento básico se o próprio povo joga fora a responsabilidade que tem nas mãos. Gostam muito é de jogar a culpa nos políticos e esquecem que é do povo que emana o poder. Mas além do poder, poderia emanar mais educação, conscientização e respeito a natureza. Apesar disso o dia foi ótimo e o ônibus não demorou a passar. Foi um piscar de olhos e já estávamos no centro da cidade. Me despedi do Renan nas proximidades da rodoviária velha e aguardei o meu ônibus por 20 minutos. Fui pra casa ouvindo um som bem relaxante. Já em casa tomei banho e revisei o material. Pretendo ter a oportunidade e o privilégio de retornar a este lugar maravilhoso outra vez.